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domingo, 31 de agosto de 2008

Maria Estefânia Anacoreta

Estive a ver, na RTP 1, um documentário intitulado "A voz da Saudade" que trata a história de uma Senhora de Santarém. Durante 7 meses, ela percorreu mais de 18.000 km pelo mato e pela floresta de Angola para levar a 1200 soldados (do seu distrito) mensagens gravadas de familiares. Maria Estefânia Anachoreta era seu nome.


Sei que este documentário já tinha sido transmitido em Abril, mas só hoje (e por um acaso) é que o vi. Fiquei a conhecer a história da vida desta Senhora, que apesar dos seus 87 anos, ainda continuava com o sentimento de ajuda ao próximo. Foi nesta idade que ainda percorreu mais uns km's para dar a ouvir aos soldados que combateram na Guiné, as ditas mensagens, uma vez que foi proibida de ir a esse país, pelo General Spínola.

No documentário, ouvem-se testemunhos (e agradecimentos) de soldados, pessoas ligadas ao Movimento Nacional Feminino (ao qual ela pertenceu), festas de agradecimento, etc. No fundo, ouve-se e vê-se e até se sente a história desta Mulher.
Além de ter pertencido ao MNF, também pertenceu durante 30 anos à Liga Portuguesa contra o cancro. Trabalhou durante uma década como bibliotecária e nunca ganhou nada pelo que fez, e chegou a ter que vender bens seus para conseguir levar a sua obra a bom porto.

Houve uma história que me ficou retida que é a seguinte: Numa das vezes que a senhora se deslocava no seu carro (um Opel Corsa antiquíssimo, e sim, apesar da sua idade, ela ainda conduzia!) a caminho de mais uma visita a um ex-combatente, o carro teve um furo. Ela encostou o carro e ficou a olhar para ele e a pensar como é que iria resolver a situação, uma vez que não tinha força para colocar o macaco debaixo do carro e trocar o pneu. Foi então, que apareceu um senhor de mota e que lhe perguntou o que se passava. Ela explicou e ele trocou-lhe o pneu. No final, ela pergunta-lhe quanto é que lhe deve, e ele diz que não deve nada. Ela persiste e diz-lhe que aceitasse pelo menos o dinheiro para uma cervejinha. Ele volta a negar e diz-lhe "Eu não lhe pedi nada quando a senhora foi a Angola dar-me a ouvir a mensagem da minha Mãe", montou-se na mota e segundo a senhora, ela nunca mais lhe pôs a vista em cima.

Conta as suas histórias dizendo que os seus Pais, as suas sobrinhas e a sua familia, por mais alegria que lhe tenham dado, nunca superaram a alegria que sentiu quando estava em Angola.

No final do documentário, fiquei a saber que ela faleceu a 9 de Janeiro de 2008 com 89 anos. A imagem da senhora com o seu gravador deve ter ficado para sempre na memória de todos os que foram tocados pela sua pessoa.

Há histórias e Histórias de vida... e esta é sem dúvida uma História!

Links:
http://historiaeciencia.weblog.com.pt/arquivo/042636.html
http://aerodromobase3.blogspot.com/2008/05/dona-maria-estefnia-anachoreta.html

Após ter visto o programa, senti que tinha que lhe prestar homenagem.

- BL

7 comentários:

Anónimo disse...

Também só ontem,dia 31 de Agosto, vi o documentário. Adorei! Fui educada nos valores da Pátria, pelo que, apesar de todos os erros do Antigo Regime, tenho o Movimento Nacional Feminino em grande conta: proporcionou aos rapazes proximidade com as famílias e vice-versa (sei do que falo, por ter tido 3 irmãos na guerra - em Angola, na Guiné e em Moçambique). O documentário comoveu-me imenso, e sinto que esta senhora tenha morrido entretanto, por dois motivos: por um lado, gostava de lhe escrever uma carta enorme, e por outro,que pena ela não ter tido o gosto, tão gratificante, de ver as reacções das pessoas ao programa!

Anónimo disse...

Também vi. Encantei-me com a D.Maria c/ os seus 80 e muitos anos. As descrições que ela fez das visitas à companhias. As reacções de alguns soldados.

Ficámos todos agarrados à reportagem. Beijinhos.

Um belo post :)
Bela

Anónimo disse...

Senhoras como estas, já não existem. Adorei a reportagem, emocionei-me, acho que esta senhora merecia uma estátua. Uma grande Senhora. Obrigado por tudo aquilo que fez pelos militares, Sra Estefânia Anacoreta. Obrigado.

Anónimo disse...

Só hoje, 03 de OUT 2013 vi este documentário na RTP2. É pena não o ter visto em vida desta Senhora. Só quem sentiu na pele o ardor da saudade sabe por escrevo senhora com S grande. Desconheço se, em devido tempo, este programa foi para o ar em horário nobre e no canal principal, mas julgo que não, atendendo a que a guerra colonial continua a ser tabu em Portugal. Revi-me naquelas imagens e, esta Senhora sim, foi diferente das outras do MNF que só se preocupavam em distribuir tabaco e isqueiros no Natal, de heli e aproveitavam as camaras da RTP para fazer propaganda ao regime. No fim do programa, dei por mim a pensar como foi possível que a minha geração tivesse passado o que passou e permitisse que tivesse nascido a geração de democratas que nos governa desde 1974. Pobre Pátria....

Anónimo disse...

É extraordinário como conseguiu conservar o gravador "Siera" e a fita em tão bom estado. Ainda que tenha sido alvo de homenagem de alguns dos directamente interessados, é pena que tenha partido sem que a Pátria inteira a tivesse honrado, como merecia, pelo muito/pouco que fez. Bem haja e, esteja onde estiver, que esteja com o dobro da paz que a alguns proporcionou. Obrigado Maria Estefania.

gatumano disse...

Na verdade, esse documentário passou na RTP1 logo a seguir ao telejornal, logo, em horário nobre. Tive a sorte de ver esse programa e ficar apaixonado pela vida e dedicação desta Senhora. E sim, é mesmo para ser escrito com S grande!

Anónimo disse...

Nao pude deixar de comentar e partilhar. Conhecia muito bem (era minha tia) e apesar de ser pequena, lembro-me muito bem da Tia. Nunca falava muito da sua vida, nem destas coisas. Sempre muito humilde, sensata, sempre despachada. saudade